Deputado por dois mandatos, o prefeito dos Canaãs é a mais nova vítima da Covid-19
Por Valfrido Silva, do blog Contraponto MS
Assim como Alan Guedes, o pecuarista Humberto Teixeira, a mais nova vítima da Covid-19 em Dourados, virou prefeito meio que no susto, aproveitando-se de um racha no grupo político de Braz Melo, ao final de seu primeiro mandato, em 1988. Teixeira era deputado estadual juntamente com Valdenir Machado, o pivô da crise, que assistia de camarote. Quando a coisa desandou, ele foi para a tribuna da Assembleia e fez um discurso enfático defendendo a candidatura de Machado, garantindo apoiar o colega, mas, dizendo que se ele não se viabilizasse esperava a retribuição do apoio.
Ao final daquele primeiro mandato Braz Melo era um dos prefeitos mais bem avaliados da história. Com uma estratégia de marketing muito bem conduzida pela jornalista Maria Goretti Dal Bosco, assim como José Elias Moreira, havia pavimentado o caminho para o Parque dos Poderes. O resultado do trabalho de Goretti deixara o prefeito douradense conhecido em todo o estado, principalmente em Campo Grande. Se não virasse governador, a exemplo do que faria Reinaldo Azambuja depois de deixar a prefeitura de Maracaju, poderia tentar a prefeitura da capital. Mas, como diria Carlos Drummond de Andrade, no meio de seu caminho havia uma pedra, havia uma pedra chamada Valdenir Machado.
É aquela velha história da vaidade à qual me referi no texto anterior. Político novo, até que surgisse o fenômeno Valdecir Artuzi o mais carismático a ocupar o velho casarão da rua João Rosa Góes, Braz achou que podia tudo. Um belo dia, num desses arroubos comuns a quem não está acostumado ao sucesso, levantou-se da tão cobiçada cadeira de prefeito e bateu em seu espaldar dizendo que ali se sentaria alguém de sua mais absoluta confiança ou um adversário. Não havia meio termo. E o deputado Valdenir Machado, liderança já consolidada, não era, sabidamente, o candidato de Braz Melo.
“Humberto Teixeira, o prefeito dos Canaãs, dos canteiros floridos do centro da cidade, do Parques dos Ipês e do Teatro Municipal, que trouxe indústrias como a Frangosul e que brigou com o governador Pedrossian para manter a sede da UEMS em Dourados”.
O projeto político para transformar Braz Melo no tão sonhado primeiro governador saído da Grande Dourados estava muito bem alinhavado pelo professor universitário Nilson Araújo, integrante do MR-8 (já em seus estertores) que andou pela região sonhando em implantar a UILA – a Universidade Latino Americana. Araújo estava a serviço do governador de São Paulo Orestes Quércia, que sonhava com o Planalto e precisava fazer um bom número de governadores país afora. Chegou a visitar Dourados nesse período, onde foi recebido com monumental carreata.
Não tinha como não dar certo, mas para isso Braz Melo precisava fazer a lição de casa, ou seja, o seu sucessor. Assim, tendo a prefeitura de Dourados como sustentáculo, poderia deixar o prefeito aliado com a responsabilidade de consolidar sua liderança regional, com isso podendo melhor cuidar de Campo Grande e do resto do Estado, para não repetir o erro de estratégia de Pedrossian com Zé Elias, que ganhou a eleição para o governo em todo o interior, só perdendo na capital, para Wilson Martins, em 1982.
O que parecia ser um blefe de Humberto Teixeira, com sua fama de grande jogador de baralho, veio antes, ainda, da histórica convenção em que seu colega Valdenir Machado perderia por apenas um voto. Sacramentado Antônio Nogueira como seu candidato, sacramentado estava também o destino político de Braz Melo, cujo sonho de virar governador acabava de ir por água abaixo.
Não bastasse o apoio de toda a “república do Panambi” comandada por Valdenir Machado, Humberto Teixeira, político habilidoso e de uma lhaneza ímpar (nem parecia que era irmão do sempre azedo Zé Teixeira), teve também seu palanque reforçado pelos deputados Londres Machado e Ari Rigo, por trás deles o grande “operador” de bastidores da época, Leonildo Bachega, só suplantado por Sérgio de Paula, o homem forte de Reinaldo Azambuja. Aliás, valendo aqui o registro de que se Sérgio de Paula é o que é hoje deve isso a Humberto Teixeira, de quem foi secretário de Fazenda e por quem foi levado à Assomasul, daí para cair nas graças de Reinaldo Azambuja.
Humberto Teixeira, o prefeito dos Canaãs, dos canteiros floridos do centro da cidade, do Parques dos Ipês e do Teatro Municipal, que trouxe indústrias como a Frangosul e que brigou com o governador Pedrossian para manter a sede da UEMS em Dourados. Seu feeling político é sempre lembrado por seu secretário de Governo Raufi Marques. Depois de comandarem a campanha de Collor de Melo em Mato Grosso do Sul, foram um dia a Brasília visitar o presidente no Palácio do Planalto. Na antessala do gabinete presidencial, observando a foto do caçador de marajás já “enfaixado”, numa soberba de assustar, “seu” Humberto, como era carinhosamente chamado, cochichou para Raufi: “este aí não é o Collor para quem fizemos campanha”. Não era mesmo, e não demoraria para o Brasil também descobrir isso.