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Waldir Guerra: um gaúcho que dialogou com a política e o agronegócio em Dourados

Ele nasceu no mesmo ano em que Dourados conquistou a emancipação política e administrativa: 1935. Essa coincidência talvez traçou o destino do gaúcho de Soledade, que virou douradense no ano de 1.982.

Estamos alando do empresário Waldir Guerra, que participou ativamente da política e do agronegócio não apenas em Dourados, mas em todo o Estado, e em apenas cinco anos de vivência na região foi alçado ao cargo de Secretário de Indústria e Comércio do Estado no governo de Marcelo Miranda (1987-1990), sendo, em 1991, eleito deputado federal por Mato Grosso do Sul.

Esses feitos estão registrados no livro “Minha História em Dourados”, que a Folha de Dourados e a 2mil Marketing Digital lançaram em abril deste ano. (Obs.: O livro está à venda na Livraria Canto das Letras – Avenida Weimar Gonçalves Torres, 2440, centro – Dourados MS).

Leia a íntegra da história:

Vim ao mundo em 16 de julho de 1935, no mesmo ano em que Dourados se emancipou do então Território Federal de Ponta Porã. No meu registo, consta que nasci em Soledade, no Rio Grande do Sul, mas, na verdade, meu nascimento se deu em uma porção mais ao noroeste de Soledade, onde hoje, geograficamente, está localizado o município de Nova Alvorada. Sou filho de Prosdócimo Guerra e Adele Fumagalli Guerra.

Atualmente, moro em Santa Catarina e, enquanto aproveito a vista do mar, deixo um pedaço, aqui, de “Minha História em Dourados”. A iniciativa surge como uma oportunidade para revisitar memórias que desenham, sem dúvida, uma participação expressiva de minha família no crescimento de Dourados e do Brasil.

Conhecendo a trajetória dos Guerra, não há como não se entusiasmar com o espírito pioneiro na política e na economia. Nós nos estabelecemos no Rio Grande do Sul, passamos, de forma surpreendente, pelo Paraná, até deixarmos uma impressionante marca em Mato Grosso do Sul, consumando, com isso, um sem fim de legados pelo país.

Voltando um pouco no tempo, durante a primeira metade do século XX, meu pai, Prosdócimo Guerra, demonstrou grande habilidade no comércio e na atividade agrícola do estado, sua visão ampla e suas viagens sempre foram rodeadas de grandes expectativas. Quando ele viajava, lembro-me de que seu retorno era sempre muito esperado, uma vez que, naquela época, as condições dos automóveis e das estradas exigiam dias para se chegar em destinos onde, hoje, podemos chegar em poucas horas.

Nova Alvorada do Sul localiza-se na região do planalto meridional do Rio Grande do Sul e, lá, o sobrenome “Guerra” se confunde com a história de construção do município. Meu pai implantou a primeira linha telefônica da região, foi o primeiro condutor habilitado do local e a única pessoa que possuía um caminhão, com o qual prestava serviços à comunidade.

Durante os primeiros anos da década de 1950, meu pai decidiu se mudar, com a família, do Rio Grande do Sul para o Paraná, onde os Guerra se notabilizaram como uma das primeiras famílias a investir no cultivo de soja e na comercialização de sementes.

Do Paraná a outubro de 1971

Fiquei no Rio Grande do Sul até meus vinte anos, servi o exército, estudei contabilidade; e, como meus pais tinham se mudado para Pato Branco, no Paraná, era hora de eu ficar próximo de meus familiares no sudoeste paranaense, local onde prosperei e constituí minha própria família.

Em 1975, eu e dona Soeli nos casamos em Pato Branco; não demorou para que a família crescesse, daí, então, vieram ao mundo meus filhos Alan, Ivan e Luciana, todos eles pato-branquenses.

Cabe lembrar que a instalação oficial da cidade de Pato Branco aconteceu em 14 de dezembro de 1952. Fizemos parte da organização política e administrativa conquistadas, um trabalho próspero e que reflete o anseio de uma comunidade que, nos dias de hoje, possui um dos melhores Índices de Desenvolvimento Humano no estado do Paraná.

Durante a chegada de minha família, em 1960, naquela região do Paraná, percebemos que o local experimentava fantástico desenvolvimento na agricultura, fruto da mecanização e do surgimento da cultura da soja. Em resumo, a abundância de oportunidade e a conveniência do solo renderam safras com bons lucros, estimulando o desejo de expansão para as lavouras.

Após quatro anos prosperando em Pato Branco, com apoio de amigos e da família, fui candidato a vereador. Foi ali que começou minha trajetória em cargos eletivos. Fui eleito para a 3ª Legislatura (1960-1964) da Câmara Municipal de Pato Branco, com 373 votos, pelo Partido Social Democrático (PSD).

Em 1964, não quis buscar a reeleição, porque, em 31 de março, consumou-se a deposição do presidente brasileiro, João Goulart, e sabíamos que os militares ficariam ali por muito tempo, isso gerou instabilidade política. Na época, eu achava que os militares ficariam por uns dez anos e acabaram ficando por vinte anos.

A minha decisão de não disputar a reeleição para vereador acabou me levando para outros objetivos; quando a vida nos direciona para caminhos diferentes, surge oportunidade para aprendermos, adaptarmo-nos e crescermos. Então, decidi me dedicar mais à expansão dos negócios da família, ao lado de meu irmão, Arno Guerra.

Em outubro de 1971, entusiasmados com a expansão da agricultura mecanizada, arrebatados pela coragem da juventude e pelo impulso aventureiro, próprio dos Guerra, eu e Arno viajamos para o então Mato Grosso; nosso destino era vir para onde hoje fica o Mato Grosso do Sul. No início dos anos 70, eram poucas as possibilidades para se chegar até essa região, e o caminho escolhido por nós foi entrar pelo sul do estado, onde hoje fica o município de Mundo Novo.

O primeiro dia de viagem, dentro do Mato Grosso, foi gasto com a travessia em uma balsa no rio Paraná, somado a um esforço ímpar para desatolar, várias vezes, a caminhonete que nos levou até o nosso destino. Ao chegarmos na Vila de Iguatemi, eu e meu irmão provamos, pela primeira vez, o churrasco de carne gorda com mandioca, certamente, um dos maiores e talvez um dos melhores costumes sul-mato-grossenses.

A primeira parada foi em Amambai, que, em 1971, já era uma bela cidade, com lavouras de porte médio, mecanizadas; e, nessas bandas, onde se viam máquinas trabalhando também se viam gaúchos e paranaenses, plantadores de soja, com quem era possível alcançar algumas boas informações.

Eu e meu irmão não encontramos quaisquer dificuldades para nos enturmarmos com o povo daqui. Logo no dia seguinte à nossa chegada, muito cedo, participamos de uma tradicional roda de chimarrão, da qual saímos, horas depois, caminhando ao lado de produtores da região, para visitar as terras lavradas.

As informações que recebemos eram de terra próspera, o que nos deixou ainda mais curiosos; então, saímos de Amambai rumo a Ponta Porã, onde avistamos um sem fim de famílias chegando, gente que colocou tudo que tinha, enlaçou e foi morar na fronteira. O novo destino era Maracaju; no trajeto, ao avistarmos imensa plantação recente de arroz, um peão, que passava por ali, informou-nos que aquela lavoura pertencia à propriedade de um gaúcho, chamado Erwin Eberhard.

É bom que se diga que, para se fazer uma lavoura nova, sempre se começa com um primeiro plantio de arroz, até mesmo com o segundo, se houver muitas raízes de guavira – aquele arbusto que produz uma das frutas mais gostosas que já provei –, por ser a planta de arroz mais rústica e de colheita mecanizada mais fácil. Depois aplica-se calcário, e iniciam-se os plantios de soja.

Alguns quilômetros depois, avistamos outra lavoura nova de arroz, em uma propriedade que, segundo informação, era de “gaúchos de Pato Branco”; a fofoca, mesmo que não autêntica, pois Pato Branco fica no Paraná, encorajou-nos a dar meia volta e entrar na Fazenda Restinga, arrendada por amigo nosso, o Rossoni.

A beleza dos campos de Maracaju era tamanha, ao ponto de fazer com que eu e Arno ficássemos instigados a arrendar uma área de mil hectares, próxima à Sete Voltas, em Maracaju.

Com um contrato de arrendamento, eu e meu irmão fomos para Dourados, cidade que vivia verdadeira explosão de desenvolvimento; ao chegarmos, a expectativa foi superada pelo deslumbramento visual, intelectual e produtivo, pois ficamos surpresos em conhecer uma cidade que possuía muitas madeireiras, produção de algodão, comércio de café e, o mais surpreendente, uma cidade com duas faculdades instaladas.

Assim, quando recebemos informações de que uma área de terras, próprias para lavoura mecanizada, localizada bem próxima ao aeroporto de Dourados, estava à venda, nem sequer paramos para pensar melhor, a decisão foi muito rápida e, três dias depois, já tínhamos a posse do imóvel. O impulso para a compra da terra, onde hoje fica a Sementes Guerra, foi influenciado pela proximidade com o campo de aviação do aeroporto de Dourados, até porque sou piloto de aviões. Inclusive, uma de minhas maiores lamentações em Dourados é saber que, até a data de confecção deste livro, Dourados ainda não possui um aeroporto pujante; na verdade, Dourados parece, por hora, tolhida de ver o espaço aéreo ajudar em sua prosperidade.

Secretário de Estado e Deputado Federal

Voltando em direção ao desfecho da história, em 1982 fui morar em Dourados, pouco tempo depois fiz parte das articulações entre os produtores de sementes, dialogando com a política e a economia do agronegócio.

Em cinco anos, conquistei o cargo de Secretário de Indústria e Comércio do Estado de Mato Grosso do Sul, durante o governo de Marcelo Miranda (1987-1990), no qual fiz parte da implementação da industrialização do estado e, consequentemente, da de Dourados. Em 1991, fui eleito deputado federal, feito também alcançado por meus irmãos, Alceni Guerra e Ivânio Guerra, que foram deputados federais pelo Paraná.

Os 88 anos de história de Dourados se confundem também com os meus 88 anos (*). Minhas realizações e as de minha família não beneficiaram apenas a nós mesmos, mas lançaram luz no caminho de dezenas de douradenses. Creio que meu legado é o tecido de coragem para transformar sociedades e alterar o curso da história.

(*) Nota da redação: a data refere-se ao ano em que o texto foi escrito, ou seja, Dourados completou 88 anos em 20 de dezembro de 2023.

Waldir Guerra: um gaúcho que dialogou com a política e o agronegócio em Dourados

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