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Quatro feminicídios em fevereiro e quase 3 mil casos de violência doméstica em MS

O feminicídio de Mirieli Santos, assassinada pelo ex-namorado em Água Clara no último sábado (22), é mais um capítulo trágico na crescente onda de violência de gênero em Mato Grosso do Sul. Com esse crime, o Estado já registra quatro casos de feminicídio apenas nos dois primeiros meses de 2025, todos ocorridos em fevereiro. O caso de Mirieli se soma a uma sequência brutal de assassinatos, como o da jornalista Vanessa Ricarte, morta pelo ex-noivo após relatar o descaso das autoridades ao denunciar as ameaças que sofria.

A escalada da violência contra as mulheres no Estado não é um fenômeno isolado. Dados do Painel de Violência Doméstica de Mato Grosso do Sul apontam que, em menos de dois meses de 2025, quase 3 mil mulheres buscaram a polícia para relatar agressões cometidas, em sua maioria, por companheiros ou ex-companheiros. A média de 56 vítimas por dia já era uma realidade em 2024, quando mais de 20,3 mil mulheres sofreram algum tipo de agressão dentro do próprio lar.

Se os números revelam a extensão do problema, a repetição dos feminicídios expõe falhas estruturais profundas: a morosidade da Justiça na concessão de medidas protetivas, a sobrecarga dos órgãos responsáveis pelo atendimento às vítimas e a persistente banalização da violência de gênero na sociedade.

A morte de Vanessa Ricarte e o despreparo do sistema

O assassinato da jornalista Vanessa Ricarte, no dia 12 de fevereiro, gerou indignação e reacendeu o debate sobre a eficácia da rede de proteção às mulheres. Horas antes de ser morta, Vanessa procurou ajuda na Casa da Mulher Brasileira, onde relatou que seu ex-noivo, Caio Nascimento, a perseguia e ameaçava. No entanto, a jornalista foi orientada a voltar para casa – o mesmo local onde seu agressor estava. Sem qualquer escolta policial, foi brutalmente assassinada a facadas.

A repercussão do caso resultou na criação de um Grupo de Trabalho (GT) pela Delegacia-Geral da Polícia Civil de MS (DGPC/MS), com o objetivo de revisar cerca de 6 mil boletins de ocorrência registrados na Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM) de Campo Grande que não resultaram em instauração de procedimento ou que possuem providências pendentes. A iniciativa é uma resposta tardia, mas necessária, diante da negligência evidenciada no caso de Vanessa.

Um sistema ineficaz: quando a medida protetiva não chega a tempo

A ineficiência da rede de proteção às mulheres fica evidente na dificuldade de cumprimento das medidas protetivas. Em Campo Grande, apenas 10 oficiais de Justiça são responsáveis por cumprir os mandados da Lei Maria da Penha, incluindo a retirada de agressores de dentro de casa. O Fórum da cidade gera, em média, 400 medidas protetivas por semana, um volume impossível de ser atendido com celeridade.

A demora na aplicação dessas medidas coloca em risco a vida das vítimas. Um caso recente ilustra essa falha: uma mulher de Campo Grande denunciou o ex-companheiro por agressão e solicitou medida protetiva em 13 de janeiro. Mais de um mês depois, ele ainda não havia sido intimado. Sem proteção, a vítima passou a conviver com novas ameaças. “Não vou mais atrás. Se eu morrer e virar estatística, fica aí minha denúncia”, desabafou.

A lentidão da Justiça também pode ser atribuída ao número insuficiente de profissionais. Para que cada oficial cumpra a média de 40 mandados por semana, seriam necessárias ao menos cinco diligências por dia. Contudo, o processo é burocrático e demorado: muitas vezes, ao chegar na casa do agressor, ele se recusa a sair, exigindo a presença da polícia, o que gera novos atrasos.

Entre estatísticas e realidades brutais

A violência doméstica e o feminicídio não são números frios – são tragédias diárias que refletem um problema estrutural profundo. O fato de quase 3 mil mulheres terem procurado a polícia em menos de dois meses revela a sensação de insegurança dentro do próprio lar. E, quando se sabe que quatro dessas denúncias terminaram em feminicídio, fica evidente que a resposta do Estado ainda é insuficiente.

A desigualdade de gênero, a cultura do machismo e a impunidade alimentam um ciclo de violência que campanhas de conscientização isoladas não conseguem interromper. Mais do que discursos, são necessárias ações concretas, como a ampliação do número de profissionais capacitados para atender mulheres vítimas de violência, o cumprimento célere de medidas protetivas e o fortalecimento da fiscalização sobre agressores reincidentes.

O feminicídio é o desfecho trágico de uma violência anunciada. Enquanto o sistema seguir falhando na proteção das vítimas, novos nomes se somarão a essa estatística macabra. O Estado de Mato Grosso do Sul precisa mais do que medidas emergenciais – precisa de uma política pública de combate à violência contra a mulher que seja efetiva, permanente e estruturada. A vida de milhares de mulheres depende disso.

(Com informações SemanaOn)

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