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Esquizofrenia: ainda um desafio, mas muito já foi alcançado

Dra. Elisabete Castelon Konkiewitz –

A neuropsiquiatria Elisabete Castelon Konkiewitz escreve, na coluna “Saúde e Bem-Estar desta semana a respeito de um transtorno psiquiátrico que traz muitos prejuízos às pessoas, famílias e sociedade: a esquizofrenia.

Dentre os transtornos psiquiátricos a esquizofrenia é provavelmente o mais severo. Ela compromete gravemente a percepção da realidade e de si mesmo, leva a comportamentos altamente disfuncionais, desorganiza a afetividade e a cognição, perturba os vínculos familiares e sociais, resultando frequentemente em incapacitação profissional, isolamento e marginalização.

Tipicamente a esquizofrenia se caracteriza pela presença de sintomas positivos (alucinações, delírios, fala desorganizada), sintomas negativos (embotamento afetivo, falta de motivação, empobrecimento do discurso e retraimento social) e déficit cognitivo, incluindo prejuízo da atenção, da memória e das funções executivas.

Trata-se de um transtorno comum que acomete cerca de 1% da população mundial. Felizmente a heterogeneidade é grande, de forma que nem todos os casos têm um prognóstico funesto.

A evolução da esquizofrenia é bastante variável. O risco de recorrência da doença, em estudos de descontinuação de antipsicóticos, é de 57,3%. Dos indivíduos com recidiva, 10% a 45% possuem resistência ao tratamento. A remissão da doença é vista em cerca de 40% dos casos dos pacientes que respondem à medicação e destes, os que se recuperam funcionalmente representam 13,5%.

A prevalência de depressão na esquizofrenia é de cerca de 40%, independentemente do estágio da doença. A taxa de suicídio ao longo da vida em indivíduos com esquizofrenia está entre 4-13%, enquanto que as taxas de tentativa de suicídio ao longo da vida variam entre 18% a 55%.

A esquizofrenia é um transtorno frequente e com impacto muitas vezes devastador sobre o indivíduo e suas famílias. Trata-se de uma doença complexa que envolve disfunções graves de natureza cognitiva e afetiva. As perturbações de percepção da realidade, de organização do pensamento e do comportamento são tão severas que representam uma ruptura biográfica – a quebra de uma linha, a descontinuidade de tudo o que a pessoa até então vivia.

Apesar disso, admite-se hoje que a esquizofrenia tenha origens no neurodesenvolvimento e, por isso, inúmeras pesquisas têm buscado elucidar os mecanismos e a natureza das alterações iniciais que levam ao transtorno, a fim de se detectá-las e intervir ainda nas fases pré-sintomáticas.

O advento dos neurolépticos foi um divisor de águas no tratamento da esquizofrenia. De fato, eles mudaram completamente a evolução da doença e o destino de quem vive com ela, tornando pela primeira vez possível sua reabilitação e inserção social.

Assim, a farmacoterapia eficaz aplainou o caminho para o movimento de desospitalização e para a terapia multiprofissional, pois, ao induzir a remissão da agitação psicomotora, das alucinações e dos delírios, resgatou os pacientes, propiciando-lhes um estado mental capaz de responder às outras medidas, como a psicoterapia.

Contudo, ainda restam grandes desafios, como eliminar os efeitos colaterais— potencialmente graves— que acompanham os medicamentos e obter a recuperação funcional completa. Especialmente as capacidades cognitivas, assim como a motivação e a responsividade afetiva frequentemente sofrem um processo de deterioração longa e gradual, de forma que o paciente, apesar de não se encontrar mais em franco surto psicótico, permanece incapaz de participar e usufruir ativamente da vida.

A esquizofrenia ainda causa muita incapacidade nas pessoas acometidas que se reverte em perdas para a sociedade, uma vez que a doença se manifesta, na grande maioria dos casos, no fim da adolescência e início da vida adulta. Os pacientes apresentam dificuldade de se inserir no mercado de trabalho e, não apenas isso, muitos acabam ficando à margem da sociedade por falta de apoio da família e de adesão ao tratamento disponível.

Por isso, é necessário que as pesquisas avancem para que um melhor entendimento da origem do transtorno se reverta em um tratamento mais eficaz, principalmente, em relação aos sintomas negativos, que ainda são os grandes causadores de incapacidade. 

Também é essencial o desenvolvimento de políticas públicas voltadas à profissionalização e à inserção desses pacientes no mercado de trabalho, propiciando-lhes, assim, inclusão social, independência e melhora da autoimagem e da qualidade de vida.

*Médica neuropsiquiátrica, doutora em Neurologia professora e pesquisadora

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